Achados e perdidos
“Dinheiro perdido, nada perdido; saúde perdida, muito perdido; caráter perdido, tudo perdido.” (Provérbio Chinês)
A máquina de lavar deve possuir um portal místico ou alguma espécie de passagem secreta para Nárnia, Caverna do Dragão, Terra 818 ou qualquer coisa parecida. Fala sério. Não é verdade? Imagino desolado e boquiaberto, com as mãos na cintura e a cabeça baixa, uma realidade alternativa inteira de meias desaparecidas que possivelmente jamais serão encontradas. Será? Não custa tentar.
Há dias em que procuro por uma, a minha predileta, por sinal. Vocês não a viram por aí não? De algodão, preta com uma faixa branca na borda. Não? Ah, obrigado. A esperança é a última que morre. Por isso, continuemos.
A verdade é que uma meia perdida é o menor dos nossos problemas. Os terráqueos andam perdendo muito mais coisas por aí do que são capazes de encontrar. E o pior e mais revoltante: nem chegamos a perceber a falta. Pode isso, Arnaldo? A regra é clara. No caso das meias, há uma dupla para evidenciar sua ausência, mas há outros que, mesmo não possuindo pares que lhes indiquem a necessidade, a falta grita justamente pelo valor que lhes damos. Filhos, celulares, canetas, óculos, o troco do pão...
Onde eu estava mesmo? Por um momento, também me perdi. Ah, sim. A meia? Ainda não encontrei. Mas há muito mais que esteja perdido. Apetite, costumes, hábitos, juízo, libido, noites de sono, respeito, tolerância, valores, vergonha na cara... Perderam-se, terráqueos. Perderam-se. Onde estão os “bons dias”, “a sua bênção, mãe, a sua bênção, pai”? Onde estão a tolerância com as diferenças, o respeito aos mais velhos e crianças? Cadê os “obrigados", os “desculpe-mes", os “com licenças"? Imagino, desolado e boquiaberto, um universo paralelo inteiro dessas coisas – talvez de mãos dadas com uma meia (quem sabe?).
Ah, a meia. Nem na máquina estava, minha senhora. Havia se perdido por trás da gaveta do guarda roupa. O filho, graças a Deus, estava com a mãe no outro corredor do supermercado. O celular estava em cima da mesa, do lado da xícara de café. A caneta está caída embaixo do banco do carro. O óculos, dentro da geladeira (meu Deus, como é que um óculos vai parar dentro da geladeira?). O troco do pão jaz amassado no bolso da calça jeans que está secando no varal. Mas e o restante, confusos terráqueos? Onde está?
O Portal Multiplix não endossa, aprova ou reprova as opiniões e posições expressadas nas colunas. Os textos publicados são de exclusiva responsabilidade de seus autores independentes.