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Além da nossa realidade

Por George dos Santos Pacheco
06/07/22 - 09:21

“Para ver muita coisa é preciso despregar os olhos de si mesmo.” (Friedrich Nietzsche)

A essa hora no Japão, venerável terráqueo, enquanto os tupiniquins assentam tijolos, dirigem coletivos, escrevem matérias jornalísticas, fazem faxina em casa, comercializam produtos e serviços… exatamente a essa hora, os japoneses já estão todos de banho tomado, estendidos ao sofá, maratonando séries, assistindo novelas, telejornais, ao jogo do Flamengo… talvez até a um reality show com orientais numa disputa por 39.181.548,50 ienes. Os mais jovens podem estar num izakaya, desafinando “Evidências” no karaokê, bebendo saquê e degustando sushi. Deitados em sua cama, os japonesinhos ouvem uma história do Dragon Ball para dormir, abraçados a uma pelúcia do Godzilla.

Fantástico, não é? Tudo tem um outro lado, mas a gente fica tão ensimesmado, que mal pode imaginar o que se passa numa realidade além da nossa. Por isso, abra seu livro na página vinte e cinco e acompanhe meu raciocínio, cara pálida. Esses dias (não faz muito tempo) eu caminhava na calçada da Praça Getúlio Vargas, imbuído de alguns afazeres, quando um vendedor de rua me chamou. “Ê, professor!”, disse ele e, num átimo, virei-me em sua direção. “Pô, o cara é um ex-aluno”, pensei. Dei meia volta, mas não o reconhecia de lugar nenhum. O cara apertou minha mão, mostrou-me os produtos, fez alguns comentários genéricos sobre “o nosso passado em comum” e no fim das contas, levei a tal mercadoria e ainda deixei uma grana para o esperto “comer uma quentinha”. Afastei-me pisando duro e soltando fogo pelas ventas ao perceber que fora ludibriado. Não nos conhecíamos de lugar algum, entretanto, o homem conseguiu me engambelar com esse papo furado.

Contudo, não tomemos o acessório pelo principal. A verdade é que a nossa dor sempre parece maior que a dos outros. O parâmetro para que eu julgasse ter sido prejudicado era a minha visão egocêntrica do caso. Para mim, pagar por um produto que não desejava, por um preço que eu não concordava, era (e continua sendo) ter prejuízo. Por outro lado, vender um produto que alguém não precisa, por um valor sabidamente desproporcional, era (e continua sendo) um êxito gigante. Eu havia me dado mal, evidentemente, mas o vendedor de rua havia se dado bem – e muito bem, diga-se de passagem.

Vê bem, caro leitor. Estamos tratando aqui apenas de pontos de vista, mas dá para esmiuçar até nos diversos sentidos que um acontecimento pode ter para uma mesma pessoa. Quem disse que eu fui prejudicado? Meu ego ofendido? E tudo o que eu ganhei com o ocorrido, onde fica? E tudo que aprendi? Pode até não ter feito sentido naquele momento, mas hoje faz e garanto-lhe, pequeno gafanhoto, que fará ainda mais depois.

Onde quero chegar com isso, curioso terráqueo? Por mais que pareça clichê, experiências boas e ruins acontecem todos os dias, carregadas de diversos sentidos além dos manifestos. Êxitos e reveses dependem apenas de pontos de vista e nem sempre são tão belos ou tão imperfeitos quanto nos parecem. Quase nunca são. Além do mais, já parou para pensar que quando você, já de banho tomado e enfarpelado no sofá, abrindo um latão de cerveja para assistir ao jogo do Flamengo, alguns dormem na rua, outros estão desempregados, e muitos outros, muitos mesmo, estão contando os caraminguás para um lanche? E nem é no outro lado do mundo, hein? Às vezes é na mesma calçada. Mas a gente fica tão ensimesmado que é difícil imaginar o que se passa além da nossa realidade.


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