Sobre o tempo
"Hoje o tempo voa, amor. Escorre pelas mãos, mesmo sem se sentir." (Lulu Santos)
Rapaz, como o tempo passa rápido, não acha? Inclusive, daqui a pouco já é Natal. Natal, cara! Dá pra acreditar? Digo, esses dias mesmo era quarta-feira e – pam! – cá estamos nós outra vez. Não dá a impressão que estamos numa bicicleta desenfreada morro abaixo, com os pedais batendo nas canelas? Sério! Quando eu era garoto, os ponteiros do relógio davam um passo para a frente e dois para trás, tamanha era sua morosidade, mas hoje, as marcações do dito cujo parecem pura e simplesmente cardeais!
"Cada ano está ficando mais curto", sintetizou sabiamente Roger Waters. Os anos, os meses, as semanas, os dias... assim, sucessivamente até a mais ínfima fração do tempo. Contudo, se tecnicamente, a duração dos dias terrestres aumenta 1,7 milésimo de segundo a cada século, por que temos essa estranha sensação de estar em vão apostando uma corrida contra o Sol? A resposta talvez esteja na percepção subjetiva do tempo.
Vê bem, apressado leitor. A vida contemporânea nos induz a preencher nosso tempo com mais ocupações do que ele pode comportar. Com o celular no bolso (ou nas mãos), vamos de casa pro trabalho, para a escola das crianças, para o comércio, para os bancos, para a academia, para a igreja, para o clube, para o barzinho, regressamos para a casa, lemos um livro, acompanhamos uma série no streaming, acessamos inúmeros aplicativos de compras, Internet Banking e quando, eventualmente, encontramo-nos ociosos, damos uma conferida nas redes sociais (já que não estamos fazendo nada). E quanto mais acontecimentos nossos sentidos percebem, mais rápido fica nosso ritmo interno.
Além disso, a perspectiva muda conforme envelhecemos: com cinco anos de idade, um ano representa vinte por cento da nossa existência; com cinquenta, essa proporção reduz para dois por cento.
Newton postulou que "o tempo absoluto, verdadeiro e matemático, por si e por sua própria natureza, flui uniformemente sem relação com qualquer coisa externa". O que ele quis dizer é que o tempo passa e dane-se, não há nada que possamos fazer quanto a isso. Aliás, tem sim: aproveitá-lo melhor. Porque se antigamente o tempo parecia sobrar, por que agora se tornou tão raro? Simplesmente porque daquelas nossas tarefas do mundo contemporâneo, em parágrafo pretérito, um monte pode muito bem deixar de fazer parte da rotina sem que alguém morra por isso.
E volto ao Natal. Sim, o Natal, cara pálida. Quando teci os comentários iniciais sobre o tempo não estava pensando em relógios, em bicicletas, na rotação desacelerada do mundo, não. O tempo, Roger Waters, Isaac Newton e companhia limitada entraram na crônica apenas pra servir de exemplo e foram ficando, ficando... Pois já é Natal outra vez, festivo leitor: as casas, as ruas, as lojas, estão todos decorados para a data. Harpas encantadas e todo o tipo de canção natalina tocam nos alto-falantes e dentro de nossas cabeças. Só que as crianças que saíram para brincar no quintal regressaram barbudas, com vozes graves e retumbantes, e o homem que me encara no espelho tem o rosto enrugado e um brilho prateado nos cabelos. Sinto um nó na garganta ao me questionar como não me dei conta dessas coisas antes. O tempo passa rápido.
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