Uma sandália para você
“A mãe compreende até o que os filhos não dizem.” (Textos Judaicos)
A gente sempre acha que sabe muita coisa. A razão se instala em nossos corações de tal maneira que a maioria de nós não dá ouvidos a nada e a ninguém. Segue em frente pela própria conta e risco para, eventualmente, quebrar a cara. Não se amofine por isso, caríssimo terráqueo. Sem crise. A nota é intrínseca ao ser humano, mais um desses nossos itens de fábrica. E embora a gente não seja lá muito chegado a escutar conselhos, fica aqui com o meu.
Nada de errado em ouvir a própria consciência. Aliás, a ideia é que sejamos cada vez mais autossuficientes. O problema é que tem camarada que leva isso muito ao pé da letra. O sujeito de opinião formada, ao mínimo vislumbre de qualquer recomendação, desconversa, reticente, quando não se torna supercilioso e inflexível. Neste caso, o melhor é deixar por isso mesmo e não se afligir – até porque se conselho fosse bom, a gente vendia, não é?
A verdade é que a maior parte das coisas que aprendi na vida me foram aconselhadas. E se não foram as melhores, ao menos não doeram quanto as que descobri independente. “Manga com leite faz mal”, “o chiclete engolido cola nas tripas” (fala sério, alguém usa isso ainda?), “espere duas horas após comer para tomar banho”, “cortar o cabelo depois da refeição faz mal”… Havendo ou não algum tipo de estudo nas Universidades de Harvard e Ohio que o parta que desmistifique tais coisas, eu é que não me arrisco, pirrônico terráqueo. Porque quem disse isso foi ninguém menos que mamãe. E se mamãe disse, está dito.
Insistir em um conselho é ser opinioso. Exceto mamãe, ela pode insistir o quanto quiser. Convenhamos, porém, que se ela está insistindo, tem alguma coisa errada que não está certa. É preciso atender de primeira e sem questionar.
“Mãe sabe das coisas” é a chancela que dá valor à ordem maternal (como se precisasse disso) – e ai de quem não obedecer. “Este conselho de mãe entra em vigor na presente data.” Descartes sustentava que o homem não pode alcançar a verdade pura através de seus sentidos. Por isso, leve aquele agasalho a mais, o guarda-chuva; saia de frente dessa TV; não leia nada dentro do carro; termina logo este banho; abra o olho com aquele cara; mastiga direito; não entorte os olhos; saia da frente do espelho quando estiver chovendo; nem pense em assobiar dentro de casa. E pelo amor de Deus, desemborque essa sandália!
Conselho de cronista não é lá essas coisas, mas você já deve ter ouvido por aí que conselho de mãe vale ouro. Pois é, pequeno gafanhoto. O dito popular podia tê-lo comparado à prata, ao bronze, ao trocado amassado no fundo do bolso que você havia esquecido (e que salva muita gente por aí nas horas de aperto), mas o comparou ao ouro. A gente sempre acha que sabe muita coisa e, às vezes, segue em frente por conta própria para, num futuro não muito distante, dar com os burros n’água. Mas se me permite esta ingerência quase protocolar, prezado, quando mamãe falar, escute, que você sempre se dará bem!
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