A prática da ética
Se lermos uma Ética para o terceiro milênio de Dalai Lama ou Ética a Nicômaco, de Aristóteles perceberemos que os dois, em tempos muito distantes, falam a mesma coisa. Um foi destinado para ser monge aos cinco anos de idade, o outro não conheceu o cristianismo. Falam de uma ética para quem não professa religiões ocidentais ou que sequer tenham alguma crença. A ética é enfocada para um ser humano, vivendo entre humanos, sem dogmas e religiões.
Seriam estas questões somente teóricas ou haveria um modo bem prático para avaliarmos se um ato é ou não ético?
Indicarei três caminhos que poderão nortear um humano para saber se o que deseja fazer é ético ou não ético.
O primeiro caminho obedece a três verbos, usados com muita frequência: quero, posso e devo. Se eu quero fazer, posso fazer e devo fazer, não haverá susto, sua atividade será ética; nesta estrada deve ser evitado a existência de algum “não” entre os verbos. Assim, se eu quero, mas não posso; se eu posso, mas não devo; se eu devo, mas não quero, significa que não devo continuar na estrada. A sua façanha não será ética.
O segundo caminho observa a relação afetiva e de confiança entre as pessoas. Se alguém quiser fazer alguma coisa, realizar uma tarefa ou desenvolver um projeto e que tenha vergonha de contar o acontecido ao seu maior amigo ou à sua mãe, não faça. Certamente não será ético.
O terceiro caminho é bíblico, serve diretamente aos cristãos, embora o que o apóstolo Paulo escreva aos Coríntios possa ser observado por qualquer pessoa, mesmo sem crença. ”Tudo me é permitido, mas nem tudo me convém” Cor. 6,12.
Como se vê, seguir um padrão ético não é complicado quanto à compreensão das questões. O ponto central estará na decisão pessoal, na estrutura de valores que se organizou na mente e no coração das pessoas, na capacidade de cada um seguir os valores inerentes às organizações das quais, livremente, escolheu pertencer.
Às vezes o clamor ético surge muito tempo depois, no entanto se a ação foi contra a ética, ele tarda, mas surge com muita força. Há um fato que esclarece esta questão, quando da visita do Papa Bento XVI à cidade polonesa de Osviecim em 2006. Poucos conhecem esta cidade. Caminhando um pouco mais dentro dela há um momento em que a paisagem muda completamente e nos deparamos com a mais famosa fábrica de mortes no mundo: Auschwitz, nome alemão desta cidade. E diante da sarcástica placa “Arbeit macht frei”, o trabalho liberta, diante deste campo de trabalhos forçados e de morte, em seu discurso histórico Bento perguntou: “e Deus aonde estava...por que Deus se calou”?
Segundo o escritor uruguaio Eduardo Galeano, em seu livro “los hijos de los días”, ainda sem tradução em língua portuguesa, Deus estava onde sempre esteve. Quem deveria falar em seu nome é que estava calada por muito tempo. No entanto, quando o ato não é ético, diante de um Auschwitz Birkenau exterminador de gente, mesmo tardiamente, a voz da ética ecoou naquele 28 de maio, dia da visita de Bento XVI.
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