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Ideologia política e palma da mão

⁣⁣

Por Hamilton Werneck
03/08/20 - 12:05

Lembrando-me de uma entrevista com um ministro do Governo Federal do Brasil na CNN, veio à mente a imagem da mão aberta. O ministro comparava as várias ideologias no mundo aos dedos da mão. Começando pelo dedo mínimo, teríamos a EE – extrema esquerda; segue-se o CE – centro esquerda; C – centro; CD – centro – direita; ED – extrema direita.

Há analistas políticos que defendem que só se consegue governar a partir do centro, mesmo que nas campanhas eleitorais a linguagem usada caminhe de um ao outro extremo.

Analisando-se o Brasil, dentro deste cenário, sobretudo nas eleições do segundo turno de 2018, a impressão que ficou foi de dois extremos, altamente beligerantes, a ponto de levar o ex-presidente Fernando Henrique, também numa entrevista à CNN, a confessar que seu voto, pela primeira vez foi nulo.

Por mais de um ano, o governo federal vem mantendo a ideia básica de dois extremos, anulando a possibilidade de acordo com as demais tendências. Eles contra nós. Dedo mínimo contra o polegar. Recentemente, houve uma mudança para garantir a base governista no Congresso Nacional. O executivo federal inclinou-se para o Centro, cujo apelido é revestido de um tom pejorativo: “CENTRÃO”.

Quem é este Centrão? Boa pergunta. Ele vem de longe, desde os tempos do Império. Revirando a História do Brasil, logo após o retorno de Pedro I a Portugal em 1831, quando seu filho e sucessor tinha ainda cinco anos de idade, este “Centrão” organizou as regências para aguardar a maioridade de Pedro de Alcântara. Foram regências trinas e, depois una, até surgir um perigo na visão dos produtores rurais, do “baronato” brasileiro e, no Partido Brasileiro, (nome do “centrão” àquela época): se o regente Feijó com a força que tinha estribado na guarda nacional, resolvesse proclamar a república, os complicadores seriam muitos. O outro partido era conhecido como Partido Português e sua meta era o retorno de Pedro I ao Brasil.

Como foi solucionado este impasse? Pedro de Alcântara estava em 1840 com quatorze anos de idade, não podendo ser coroado e Feijó ameaçando transformar o Brasil numa República. A solução, tipicamente brasileira, com jeitinho brasileiro foi única e se resume numa quadrinha que diz muita coisa e define o partido que a criou: “queremos Pedro II mesmo sem ter idade, fora com a Constituição e viva a maioridade”. Assim, o Partido Brasileiro (nome do Centrão àquela época), baixou a maioridade, coroou Pedro II, destronou o Regente Feijó e voltou com a maioridade conforme os termos da Constituição de 1824.

Esqueceram das cláusulas constitucionais por alguns momentos, resolveram a questão “à brasileira” e iniciaram o Segundo Império. O “baronato” brasileiro aplaudiu e nós caminhamos até 1889, quando foi proclamada a Republica.

Se formos pensar no Brasil da Constituição de 1988, nossa Constituição Cidadã, todos os presidentes formaram a base política do governo com este “Centrão”. Presidentes de Centro Direita e Centro Esquerda governaram com o Centro. E mais que isso: o atual Presidente da República, enquanto foi deputado federal, manteve-se nos grupos do “Centrão”, tanto nos governos de Centro Direita, como nos de Centro Esquerda. Esta aglomeração política só deixa o governo ou vota o impedimento do presidente, quando lhe interessa. É uma aglomeração política de partidos médios ou pequenos, difícil de ser comprada, porém fácil para ser alugada. E o novo presidente é observado até o momento em que escolhem cooptá-lo para este centro político. Este jogo é fisiológico.

Há alguns anos, o PT foi contra ele, até render-se e passar a dependente. O apoio é obtido mediante a oferta de cargos em ministérios, muitos deles criados para abrigar a nova base política. Por isso, chegamos a ter mais de vinte ministérios, voltamos após o impedimento de Dilma Rousseff a ter menos, o atual presidente cortou vários e aglutinou outros e, agora, ao inclinar-se para o “Centrão” começou a criar ministérios, o que levou a deputada estadual de São Paulo, Janaína Paschoal a perguntar: “Foi para isso que fomos às ruas”?

O povo brasileiro e o eleitor brasileiro cansaram deste jogo. A prova disso foi que em 2018 foi eleito um candidato com discurso claro contra os conchavos políticos, principalmente com este “Partido Brasileiro”. São muitos, porém, todos aglomerados ao Centro. Mas isto não foi o suficiente para agradar a todos, por isso 47 milhões votaram no candidato que perdeu as eleições e 45 milhões anularam o voto, votaram em branco ou se abstiveram. Como os eleitos, enquanto governam, sempre perdem alguma substância eleitoral, provavelmente o atual presidente não repetiria os 57 milhões de votos que recebeu. É por isso que as oposições somam os votos não direcionados ao atual presidente nas eleições de 2018 a uma suposta perda ao longo do tempo e afirmam alto e bom som que a oposição representa 70%. Somos 70%.

Eis a razão da corrida do atual presidente para os braços daquele que, historicamente, foi chamado de Partido Brasileiro.

Mesmo assim, nesta interpretação de ideologias que se alojam de um a outro extremo, dentro do próprio governo federal, em nossos dias, há duas correntes muito cristalinas: enquanto alguns observam os cinco dedos da mão, outro grupo vê somente dois dedos, o mínimo e o polegar. Pior que esta visão é a divisão do bolo em apenas dois grupos e mais aterrorizante ainda é esta volta a 2.500 anos antes de Cristo, época em que viveu o filósofo Mani, na região do atual Iraque e sua doutrina, o maniqueísmo. E, por incrível que pareça, há algo pior, na interpretação ideológica, porque junto ao polegar está a extrema direita que se apresenta como a única certa e, junto ao dedo mínimo, todos são considerados “comunistas” por esta extrema direita. Será difícil para o governo federal conciliar a duplicidade de interpretação ideológica, sobretudo “olavista”, na convivência com o “Centrão”.

Nesta minha análise, encontro erros grosseiros de interpretação histórica que só podem ser imaginados por pessoas que acreditam que a terra é plana. Não se consegue governar um país dessa maneira, nem encontrar clima de paz e estabilidade para conseguir consensos.

A continuar como está e se nenhuma atitude for tomada, nós chegaremos a desenvolver uma alta capacidade de desconstrução que, somada à pandemia da Covid 19, levará o país à anarquia. Então, todos perderão, a reconstrução será cara, tanto social quanto econômica.


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