Sobre a espiritualidade
A espiritualidade está entre os componentes da identidade humana. Espiritual não é o mesmo que abstrato, ao contrário, é o que, concretamente, identifica a pessoa e a torna aquilo que ela é. Na história da espécie, o ponto de virada na linha evolutiva se deu, efetivamente, quando o mundo passou a ser compreendido sob o ponto de vista simbólico.
Se é verdade que o que identifica o ser humano passa por sua espiritualidade, é verdade também que tal inclinação só se dá por conta da profunda e radical ligação de cada pessoa com seu chão, sua história e, por que não, com sua finitude. É curioso, mas parece que o que torna o ser humano sedento por infinito é sua mais absurda limitação.
As religiões nasceram como expressão dessa saudável tensão que habita todos os indivíduos. Surgiram com a força de discursos que ajudam a dar sentido para a vida.
A realidade é muito semelhante para todos: questões relacionadas à vida, ao trabalho, à sobrevivência, à família, aos relacionamentos, ao bem e ao mal. Mas essa mesma realidade guarda muitas diferenças se observada sob o ângulo dos costumes de cada sociedade. Razão pela qual as práticas religiosas parecem tão distintas e, por vez, conflitantes.
A tensão que, historicamente, fez dividir e conflitar civilizações inteiras se deve mais à incapacidade para lidar com as diferenças. A intolerância religiosa torna míope a visão. As vezes, porque não sabe acolher a experiência do outro como autêntica e verdadeira, o homem religioso perde a chance de compreender a riqueza que o seu suposto oponente tem.
Como as religiões são expressão recortada da busca humana por sentido e realização, a religião do outro me ajuda a ver e compreender o que a minha não é capaz de realizar plenamente. Isso não significa, no entanto, que a minha experiência seja menor ou insuficiente, apenas que não é capaz de dar conta do todo.
Os conflitos religiosos são, antes de tudo, preconceito. O desafio mora no esforço para compreender e aceitar o outro. Tal empreitada, todavia, tem sua força motriz no interior da própria experiência religiosa. O mesmo combustível que impulsiona o indivíduo para busca do significado de sua existência poderá fazê-lo tolerante e respeitador, quando o fizer ver que na experiência do outro reside parte das respostas pelas quais ele próprio tanto anseia.
No fim das contas, o que importa mesmo é o diálogo e o respeito.
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